Em diversas postagens, foram postadas no blog explicações sobre o custo da falta de capital intelectual no Brasil.
Em
recente debate sobre o impacto da tecnologia no agronegócio, o meu interlocutor
saiu com esta perola da sabedoria rasa: “nós vendemos soja para a China e
compramos tecnologia para o campo e está tudo certo porque o crescimento do PIB
do agronegócio é significativo nos últimos anos”.
A análise
rasa de um fenômeno tem o grave problema de desconsiderar diversos componentes
do sistema e de gerar um resultado falacioso.
É plena
verdade que o PIB do agronegócio vem crescendo significativamente nos últimos
anos e que uma boa parte deste crescimento vem do uso de tecnologias que
aumentaram fortemente a produtividade do campo.
O
problema (que aliás não é novidade) é o fato de toda a tecnologia de
equipamentos e inteligência artificial ser importada. O resultado disto é uma
falta de engenharia nacional no setor e de empresas de equipamentos que
produzam usando tecnologia brasileira.
O artigo
“Agricultura familiar precisa ser mecanizada” (https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2024/03/agricultura-familiar-precisa-ser-mecanizada.shtml,
acessado em 25/03/2024) revelou as dificuldades da mecanização da agricultura
familiar brasileira.
Os
grandes fabricantes transnacionais não têm interesse em produzir soluções para
plantações de porte menor e o único fabricante nacional no setor de tratores tem
participação insignificante no mercado.
Este
cenário impede que a agricultura familiar conquiste ganhos de produtividade com
a mecanização e inteligência artificial.
Como cerca
de 70% dos alimentos consumidos no Brasil vem da agricultura familiar, isto significa
que os alimentos básicos têm um custo muito maior que o necessário (ou seja, é um
dos motivos da insegurança alimentar no Brasil).
Os
autores do artigo falam apenas da mecanização como ferramenta de aumento da
produtividade, no entanto, a inteligência artificial é capaz de resultar em
ganhos de produtividade espetaculares para a agricultura familiar nacional,
basta o país sair do marasmo e investir com seriedade no desenvolvimento da
engenharia nacional.
As
gigantes transacionais vão continuar com o seu foco nos alimentos negociados em
grandes volumes nas bolsas e dificilmente irão investir no desenvolvimento de
tecnologias para a agricultura familiar.
As
análises rasas levam para erros colossais e custos na estratosfera. Quem sabe
um dia o gigante que dorme em berço esplêndido acorde.
Um outro
caso de falta de capital intelectual são os apagões na cidade de São Paulo.
A ruptura
de cabo de energia deveria afetar apenas o local atendido pela rede elétrica e
solução trivial seria a reconstrução da fiação.
Para
reconstruir é preciso ter a fiação reserva e um mapa detalhado do cabeamento
com características físicas dele.
A falta
destes componentes impede a recuperação da energia do local atendido pela rede
elétrica.
No
entanto, o agravamento do problema com aumento da rede atingida pelo apagão
indica a adoção de uma solução inapropriada para resolver o problema e a
dificuldade da operadora de informar uma previsão para a normalização da
energia revela que estão batendo cabeça contra o problema.
Passa a
impressão de solução na linha tentativa e erro, sem uma abordagem estruturada
para resolver o problema.
O impacto
econômico da falta de energia no comercio e residências é de elevada monta,
pois a falta de energia prolongada e sem previsão de retorno está
inviabilizando diversos empreendimentos e em breve teremos demissões e calotes.
Foi
revelado que o prejuízo total ainda não foi calculado, mas as estimativas iniciais
são graves (SP: Prejuízo de apagão 'chega à casa do milhão', diz federação do
comércio, https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2024/03/22/prejuizo-de-apagao-em-sp-chega-a-casa-do-milhao-diz-federacao-do-comercio.htm).
As perdas
causadas pela falta de capital intelectual da operadora são gigantescas e
aumentam a cada dia em que uma solução definitiva não é entregue.
A falta
de previsibilidade gera a insegurança dos donos dos negócios e pode gerar
consequências catastróficas, como por exemplo a necessidade e obter empréstimos
bancários para pagar os prejuízos e a falta de recursos para pagar estes
empréstimos.
Está
sendo gerada uma espiral crescente de perdas que pode impactar todos os membros
de uma cadeia produtiva longa.
Mais uma
vez, a ausência da engenharia cobra um preço alto.