quinta-feira, 7 de maio de 2015

Business-Defined IT

O Brasil vem apresentando desde a primeira década do século XXI graves problemas no entendimento do real significado dos serviços de Tecnologia de Informações e Comunicações (TIC). Estas dificuldades foram agravadas com a era dos aplicativos. Para alguns, o país ainda vive a era dos advogados. O caso descrito no artigo “Justiça suspende Uber no Brasil e exige bloqueio de app em celulares” (http://idgnow.com.br/mobilidade/2015/04/29/justica-suspende-uber-no-brasil-e-exige-bloqueio-de-app-por-apple-e-google/, acessado em 05/05/2015) revela a intensidade do problema.

O artigo afirmou que o juiz Roberto Luiz Corcioli Filho da 12a Vara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo determinou na terça-feira dia 28 de abril de 2015 a suspensão do aplicativo de transportes Uber no Brasil e ordenou que as empresas Google, Apple, Microsoft e Samsung retirem o aplicativo das suas lojas em tempo real de apps e impossibilitem remotamente a utilização do aplicativo Uber pelos usuários que já instalaram o app.

A minha primeira pergunta sobre a determinação é: “O que seria a suspenção remota pelas empresas Google, Apple, Microsoft e Samsung do aplicativo de transportes Uber no Brasil?”. Se a “suspenção remota” implicar em alterar as configurações ou os programas do aparelho do usuário sem a sua autorização e conhecimento isto significa que existirá uma invasão. Da mesma forma que no mundo real invadir uma propriedade privada é crime, no mundo virtual também é. Invadir e promover alterações no aparelho do usuário como suspender remotamente a execução de um aplicativo é equivalente ao crime de vandalismo do mundo real. Será que existe entendimento disto pelo juiz?

A minha segunda pergunta sobre a liminar é: “As empresas Google, Apple, Microsoft e Samsung tem recursos técnicos para suspender remotamente sem conhecimento e autorização do usuário um aplicativo comprado nas suas lojas virtuais?”. Se a resposta for positiva, então o pilar privacidade do Marco Civil de Internet do Brasil é uma peça de ficção (Atualmente um celular armazena informações sobre a saúde dos usuários, senhas, documentos pessoais e empresariais, fotos e etc. O que impede que as empresas Google, Apple, Microsoft e Samsung capturarem ouras informações privadas, corporativas e pessoais nos celulares? Qual garantia de privacidade os usuários tem?) Se a resposta for negativa, então qual o sentido da determinação. Será que o juiz Roberto Luiz Corcioli Filho tem conhecimento destas implicações?

A minha terceira pergunta é bastante singular: “No endereço http://www.amazon.com/Uber-com-Uber/dp/B00NF3UFSG, acessado em 06/05/2015 eu encontrei o aplicativo de transportes Uber na loja em tempo real de apps da Amazon. No entanto, o juiz Corcioli não determinou a suspenção remota do aplicativo pela empresa Amazon. Será que o juiz e advogado do Sindicato dos Taxistas de SP sabem que existem outras lojas virtuais de aplicativos além das empresas Google, Apple, Microsoft e Samsung?” Se a resposta for positiva, porque endereçaram na liminar apenas quatro empresas. Se for negativa, qual efetividade eles esperam de ações assim. Será que eles imaginam que a empresa Google é capaz de suspender remotamente um aplicativo instalado através da loja virtual da Amazon?

A quarta pergunta consegue ser mais singular que a terceira. A Uber é uma empresa de tecnologia que conecta as pessoas com os motoristas. Em outras palavras, a empresa exerce o papel de um carteiro que entrega mensagens. Se o juiz entende que existem ilegalidades, então elas são cometidas pelos motoristas. A pergunta que não quer calar é: Porque o juiz não suspendeu as atividades dos motoristas? Ele poderia exigir da Uber a lista dos motoristas cadastrados e suspender as atividades de motorista de cada um deles.    
Por incrível que possa parecer quinta e última pergunta supera em estranheza todas as outras. Os aplicativos instalados nos celulares acessam os servidores da Uber. Para suspender os serviços desta empresa no Brasil, basta que a rede nacional não roteie os pacotes os servidores. A minha última pergunta sobre este caso é: Porque o juiz não relacionou no seu despacho que as empresas provedoras de internet no Brasil bloqueiem o endereço IP dos servidores da Uber? Não seria uma medida menos intrusiva do que exigir a suspenção remota do aplicativo nos celulares dos usuários? Não seria uma medida mais direta e melhor direcionada? Será que o juiz e advogado do sindicato tem conhecimento que existem ações mais efetivas para a suspenção do aplicativo?

Resumo

No Brasil da era dos advogados é comum exigir do carteiro que apenas entrega as cartas a responsabilização pelo seu conteúdo. Existem diversos processos que caminham nesta linha onde o alvo são empresas como Google, Apple, Microsoft, Samsung e etc. O país precisa urgentemente aprender que o autor da mensagem é o real e único responsável pelo seu conteúdo. Se existem falhas no caso da Uber, as mesmas são da responsabilidade dos motoristas. Não é razoável punir a empresa de tecnologia ou os usuários.

O caso Uber é muito semelhante ao WhatsApp no Brasil (“Juiz do Piauí determina suspensão do aplicativo WhatsApp no Brasil”, http://idgnow.com.br/internet/2015/02/25/juiz-do-piaui-determina-suspensao-do-aplicativo-whatsapp-no-brasil/, acessado em 06/05/20115 e “Desembargador derruba decisão de juiz que queria suspender WhatsApp no país”, http://tecnologia.uol.com.br/noticias/redacao/2015/02/26/desembargador-derruba-decisao-de-juiz-que-queria-suspender-whatsapp-no-pais.htm, acessado em 06/05/2015).

A decisão do bloqueio durou nos dois casos algumas poucas dias. Também no caso Uber existiu a revogação das medidas contra a empresa. O artigo “Justiça de São Paulo extingue ação de taxistas contra aplicativo Uber” publicado em 04/05/2015 (http://tecnologia.uol.com.br/noticias/reuters/2015/05/04/justica-de-sao-paulo-extingue-acao-de-taxistas-contra-aplicativo-uber.htm, acessado em 06/05/2015) revelou que a liminar foi revogada em menos de uma semana, pois a Justiça de São Paulo extinguiu na segunda-feira dia 04/05/2015 a ação dos taxistas.  Considerando o excesso de trabalho e de ações em curso no judiciário seria interessante que a era dos advogados entenda melhor a era dos aplicativos para aumentar a efetividade do poder judiciário nacional.

É claro que foge do escopo desta postagem criticar as decisões do poder judiciário. O objetivo é mostrar que o mundo atravessa por um novo momento econômico que está sendo definido pelo software. No meu ponto de vista, a maior explicitação que estamos vivendo à pleno vapor a era dos aplicativos é o artigo “Novo aplicativo permite que usuários façam panelaço com smartphone” (http://idgnow.com.br/internet/2015/05/06/novo-aplicativo-permite-que-usuarios-facam-panelaco-com-smartphone/, acessado em 06/05/2015). No domingo, dia Internacional da Mulher, 8 de março de 2015, os brasileiros bateram panelas durante o pronunciamento da presidente Dilma Rousseff para explicitar o seu descontentamento com o governo dela.

No programa do PT veiculado em rede de nacional de televisão na noite da terça-feira dia 5 de maio de 2015 já existiam pessoas utilizando aplicativos como o iPanelaço (Novo aplicativo permite que usuários façam panelaço com smartphone, http://idgnow.com.br/internet/2015/05/06/novo-aplicativo-permite-que-usuarios-facam-panelaco-com-smartphone/, acessado em 06/05/2015) para expressar o seu descontentamento com o governo do PT. Em menos de 60 dias foram desenvolvidos e publicados nas lojas virtuais de aplicativos vários aplicativos como “Kit Panelaço" (10 de março), “Panelaço" (18 de março), "Panelaço App" (6 de abril), "Panelaço & Vuvuzela" (10 de abril) e "Panelaço Brasil" (5 de maio) para que a população manifeste a sua insatisfação sem estragar as suas panelas.


Todos os que um dia já se aventuraram nos projetos de desenvolvimento de software sabem que o tempo entre identificar uma oportunidade de negócio e entregar uma aplicação funcionando é no melhor caso de 90 dias. Na era dos aplicativos este prazo caiu drasticamente, após a identificação de uma oportunidade de negócio em 08/03/2015, o desenvolvedor publicou em 10/03/2015 o aplicativo “Kit Panelaço". O prazo é de impressionantes dois dias. A era dos aplicativos está neste crescimento espetacular por causa dos seus prazos extremamente reduzidos. O reduzido indicador “time to market” resultante da filosofia do negócio definido pelo software é sem sombra de dúvida a essência da era das aplicações.