quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Atraso, atraso e mais atraso


No plano de recuperação, ao qual a Folha teve acesso, a varejista atribui suas dificuldades financeiras a uma série de fatores: crise da economia brasileira, falta de abastecimento pelos fornecedores, dificuldades com a implementação de um novo sistema tecnológico e escassez de crédito bancário. Fonte: Saraiva propõe a credor pagar em 15 anos só 5% da dívida, https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2019/02/saraiva-propoe-a-credor-pagar-em-15-anos-so-5-da-divida.shtml, acessado em 06/02/2019.

Pela primeira vez no Brasil, uma empresa relaciona de forma direta, clara e explícita as suas dificuldades financeiras com os seus sistemas computacionais.
Foi afirmado que consta no plano de recuperação da livraria Saraiva que as suas dificuldades financeiras estão relacionadas com as dificuldades com a implementação de um novo sistema tecnológico.

A empresa explica os seus constantes prejuízos através de três fatores externos e um interno. Em relação aos fatores externos as empresas nada podem fazer. Elas apenas reagem a eles. Infelizmente a pobreza intelectual das corporações brasileiras alcançou patamares extremamente elevados. Elas são incapazes de reagir corretamente aos fatores externos.

Os aspectos externos (crise da economia brasileira, falta de abastecimento pelos fornecedores e escassez de crédito bancário) impactam toda a economia nacional. São condições gerais do ambiente de negócio brasileiro. É evidente que o impacto destes três fatores nas empresas é diferente. No entanto, todas as empresas foram impactadas e muitas produziram resultados positivos. Livrarias concorrentes da Saraiva produziram lucros enquanto ela era deficitária.

Isto significa que vale a pena aprofundar o entendimento do único fator interno declarado no plano de recuperação como determinante da dificuldade financeira da livraria (dificuldades com a implementação de um novo sistema tecnológico).

Em diversos momentos eu invadi os cursos ministrados pelo profeta Bob. Em algumas invasões eu tomei a palavra do brilhante instrutor e apresentei situações (em uma ou duas o Bob estava presente comigo) onde a livraria Saraiva perdeu dinheiro e vendas por falhas do seu sistema computacional. Não é um ou outro caso. Eu presenciei mais de dez situações. Não eram falhas pontuais, pois vinham ocorrendo por anos.

Quem lê o plano de recuperação da livraria Saraiva imagina que o fator interno “dificuldades com a implementação de um novo sistema tecnológico” é um caso pontual resultante de erros de uma implementação de um sistema. Eu tenho presenciado falhas nos sistemas computacionais da livraria desde o ano de 2010. Quase uma década. Não é um problema circunstancial. É um problema estrutural.

Eu já escutei conversas entre os vendedores da loja do Shopping Paulista, onde foi dito que não adianta ligar para o suporte, pois eles nunca resolvem o problema. A solução oferecida pela central de atendimento para os vendedores e funcionários das lojas é o tradicional desliga e liga computador, roteador e etc.

Em nenhum momento existe uma pesquisa das causas das falhas e das dificuldades operacionais dos usuários com os sistemas de suporte aos negócios. O meu amigo Bob, ficaria de cabelos em pé (se ele tivesse cabelos) com a realidade da central de atendimento.

Não adiantou nada investir em melhores práticas, contratar serviços de terceiros com dezenas de certificações. O resultado final foi muito pobre. Considerando que livrarias como livraria da Vila e Martins Fontes foram lucrativas enquanto a Saraiva foi deficitária fica claro que o fator interno foi determinante para o resultado operacional.

As escolhas da livraria Saraiva para a contratação de capital intelectual para a sua organização de tecnologia foram as piores possíveis. A empresa gastou tempo e dinheiro com pejotinhas certificados e não foi capaz de implementar corretamente os novos sistemas de tecnologia.

Muitos me perguntam sobre qual é a importância do Service Desk em uma empresa. Em geral os técnicos ficam decepcionados com a minha resposta, pois enfatizo a questão do capital intelectual que gera lucro (produtividade) e minimizo os bits e bytes.

Existem os que desejam respostas mágicas sobre como fazer a empresa reconhecer a importância da central de atendimento. Não existem mágicas. É preciso trabalhar na direção de encontrar respostas relevantes para o negócio. A maioria está mais preocupada em articulações de baixo valor agregado como reduzir a quantidade de incidentes ou diminuir o tamanho da fila de espera.

O resultado de tais políticas é o de sempre. Perda em cima de perda. Prejuízo em cima de prejuízo. Falência em cima de falência.

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