Muitos estão comparando o imbróglio jurídico da Apple contra o FBI com o caso do Facebook com a justiça brasileira. Infelizmente está faltando informação e conhecimento nos comentários e análises. O caso da apple contra o FBI nos Estados Unidos é análogo ao FBI pedir ou exigir que um fabricante de cofres viole a segurança do seu produto com base na argumentação que dentro do cofre existem documentos que vão incriminar os terroristas presos. Estamos claramente falando de uma questão comercial onde o fabricante pode perder bilhões de dólares por desrespeitar os direitos de todos os seus clientes. Com tantos crimes passando de uma forma ou outra pelo sistema financeiro seria razoável ver o FBI solicitando acesso aos computadores e cofres dos bancos. Eu nunca vi até hoje este nível de disputa contra a privacidade entre o FBI e bancos. Parece que está no mínimo faltando coerência histórica de atuação.
O caso da prisão do vice-presidente do Facebook por não colaborar com a justiça brasileira na quebra do sigilo do usuário do WhatsApp é mais um caso de falta de capacitação do que de coerência histórica. Em primeiro lugar a justiça brasileira foi incapaz de estabelecer um acordo de colaboração com as redes sociais que estão instaladas fisicamente nos Estados Unidos e cumprem a legislação americana (O acesso a uma rede social fora do Brasil deve ser entendido como viagem ao país que abriga os servidores). Este acordo deveria ter sido estabelecido em 2012. Estamos em 2016 e nada foi feito. Eu tenho total certeza que as redes sociais americanas têm total interesse na eliminação dos casos de crimes. Elas fariam de bom grado acordos de cooperação.
No entanto, tem pouco sentido pedir publicamente a colaboração do WhatsApp em um processo que corre em segredo de justiça. Está mais do que na hora da justiça ser mais coerente e colaborativa com as redes sociais. As informações solicitadas como o IMEI e sistema operacional são afirmadas como inexistentes pelo Facebook. A justiça brasileira precisa falar de onde ela arrumou a informação que o WhatsApp guarda o IMEI e sistema operacional dos equipamentos dos seus usuários. É preciso acabar com este tipo de conflito.
Alguns juristas afirmam com base no Marco civil de Internet (MCI) brasileiro que os registros solicitados pela justiça nacional devem ser armazenados pelo provedor. Qualquer profissional de tecnologia qualificado vai facilmente mostrar que a guarda do IMEI ou sistema operacional do equipamento não consta nas obrigações definidas no MCI. Além do problema da definição do que deve ser armazenado pelos provedores, existe a questão da geografia jurídica. Os servidores do WhatsApp estão localizados nos ESTADOS UNIDOS e atendem aos requisitos de privacidade da lei americana. Isto significa que existe um claro conflito legal que já deveria ter sido resolvido pela justiça brasileira.
Seria interessante esclarecer porque a justiça brasileira não solicita estas informações para as operadoras nacionais de telecomunicações. Elas são obrigadas a cumprir as determinações do MCI. Com base nos registros dos provedores é possível identificar a localização geográfica do autor das mensagens e fazer uma ação de busca e apreensão dos equipamentos e aí ter acesso integral as mensagens. O que realmente está faltando não é colaboração do WhatsApp.
A pergunta que não quer calar é o que vai acontecer com os presidentes da Microsoft, Alphabet, Apple do brasil se os equipamentos apreendidos estiverem criptografados com senhas? Eles vão ser presos porque não destruíram a confiança que os seus clientes depositaram neles? A justiça brasileira vai continuar a colocar na cadeia trabalhadores honestos e deixar nas ruas os bandidos? Até quando o Brasil vai ignorar que o mundo mudou e que é preciso contratar engenheiros qualificados para fazer parte do sistema judiciário? Para finalizar é sem sombra de dúvida brilhante a estratégia de criar um conflito pelo bloqueio do WhatsApp e esperar a colaboração deles. Os gênios da justiça nacional precisam urgentemente de um chapéu pensador.
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