segunda-feira, 24 de outubro de 2016

Fragilização do Emprego

Em setembro, predominou na pauta dos meus encontros com os empresários e estudantes o tema reforma do emprego no Brasil. Nas conversas, ficou claro que muitos ainda têm uma visão distorcida do emprego e do trabalho no Brasil e que falta compreensão sobre qual será o impacto da indústria 4.0 no emprego e trabalho no nosso país.  A principal distorção que existe na cabeça de uma grande parte dos agentes de mercado sobre o emprego e trabalho é a mistura deles como sinônimo. Recentemente eu li no blog de uma de uma das principais empresas evangelizadoras em recursos humanos no Brasil que as empresas exponenciais são organizadas por projetos e no mesmo texto o autor destacou uma pesquisa falando de milhões de oportunidades que serão geradas entre o ano de 2010 e 2020 para os profissionais que trabalham por projetos.

Infelizmente, o artigo reforça o grave erro de interpretação que muitos estão cometendo sobre o que vem acontecendo no mercado de emprego e trabalho internacional e brasileiro. As empresas exponenciais não estão gerando oportunidades de trabalho por projeto. Elas estão na realidade gerando oportunidades de trabalho por atividade. O que eu quero dizer com isto?

Estas empresas mantém um corpo de empregados que são o núcleo do planejamento corporativo. Este núcleo são o que podemos chamar de empregados. Estas pessoas que estão dedicando a sua carreira profissional para que a empresa alcance o seu Massive Transformative Purpose (MTP) planejam os projetos da organização. Os empregados da firma desdobram o planejamento em atividades e toda a vez que uma atividade necessita de recursos humanos para a sua execução eles contratam as pessoas para realizar aquela ação específica. Normalmente as empresas buscam estes recursos nos portais como Gigwalk (http://www.gigwalk.com/, acessado em 24/10/2016).

As contratações duram apenas o período de duração da atividade, por exemplo, a demonstração de um produto em todos os supermercados da zona sul da cidade de São Paulo durante um final de semana. É fácil perceber que é uma contratação por atividade e não por projeto. O projeto vai demonstrar o produto em todos os supermercados da cidade de São Paulo e vai durar alguns meses.

A pesquisa “PMI’s INDUSTRY GROWTH FORECAST” (http://www.pmi.org/-/media/pmi/documents/public/pdf/business-solutions/project-management-skills-gap-report.pdf, acessado em 24/10/2016) afirmou que serão gerados aproximadamente 16 milhões de novos papeis ano no gerenciamento de projetos entre 2010 e 2020. Para os que entenderam a base de dados da pesquisa fica claro que serão geradas 16 milhões novas atividades e não 16 milhões de novas oportunidades de trabalho. Os profissionais atuam em uma das atividades do projeto. A duração do projeto é muito maior do que a duração da participação do profissional.

Felizmente, foi possível esclarecer os grupos de estudantes e empresários estas diferenças. Pode parecer que é uma mera questão de semântica, mas não é. A diferença numérica do equilíbrio da oferta e demanda por profissionais é muito grande e pode gerar uma legião de desempregados altamente qualificados por excesso da oferta de mão de obra. Os agentes de mercado têm que ser responsáveis, claros e objetivos e manter os estudantes e empresários corretamente informados dos fatos. Quando o assunto Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) entrou pauta, todos os presentes elevaram o nível da sua excitação. Muitos ataques e defesas sobre a CLT foram realizados com base em suposições, intuições e emoções.

Em função dos aspectos emocionais, eu resolvi trazer os números para o debate. O Brasil tem cerca de 200 milhões de habitantes (Brasil tem mais de 204 milhões de habitantes, diz IBGE, http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2015/08/28/brasil-tem-mais-de-204-milhoes-de-habitantes-diz-ibge.htm, acessado em 24/10/2016). Destes 204 milhões de habitantes, 166 milhões de pessoas estão em idade de trabalho (Com alto índice de desemprego, Brasil joga fora o seu futuro, http://www1.folha.uol.com.br/colunas/antoniodelfim/2016/10/1819886-com-alto-indice-de-desemprego-brasil-joga-fora-o-seu-futuro.shtml?mobile, acessado em 24/10/2014).

Dos que estão em idade de trabalho, 64 milhões não trabalham e nem estudam, ou seja, desistiram de procurar trabalho por causa da falta estrutural de emprego. Portanto a força de trabalho é de 102 milhões de pessoas. Em setembro de 2016, o Brasil apresentou o cenário onde 90 milhões estão empregados e 12 milhões estão desempregados (total 102 milhões). Dos 90 milhões que estão empregados o Brasil registrou no final do ano de 2015 48,06 milhões de empregos com carteira assinada (Brasil perdeu 1,5 milhão de vagas com carteira assinada em 2015, pior marca em 31 anos, http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2016/09/1813988-brasil-perdeu-15-milhao-de-vagas-com-carteira-assinada-em-2015-pior-marca-em-31-anos.shtml?mobile, acessado em 24/10/1016). Ou seja, os 48,06 milhões entre 166 milhões de pessoas estão em idade de trabalhar tem empregos CLT representam apenas 28,95% dos empregos.

Em outras palavras, a reforma da CLT com precarização do trabalho já ocorreu. Querer discutir “nenhum direito a menos” como as pessoas que destruíram o país querem discutir insanamente através de manifestações e distúrbios é algo sem nexo algum. As tolices defendidas pelos setores atrasados da sociedade brasileira e a ausência de conversas concretas sobre o emprego e trabalho no Brasil geraram a pior reforma possível da CLT no país. Ela ocorreu de forma arbitrária com a perda de todos os direitos para aproximadamente 120 milhões de pessoas. Os 48 milhões que ainda tem empregos CLT são privilegiados e estão sob enorme ameaça.

Em poucos anos, as atuais posturas vão nos levar para a extinção na prática da CLT. A recente greve dos bancários (Greve dos bancários é encerrada em todo o País, http://www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2016/10/greve-dos-bancarios-e-encerrada-em-todo-o-pais, acessado em 24/10/2016) mostrou aos patrões que o seu impacto no dia a dia da população foi pequeno. O crescimento dos bancos virtuais como o Nubank (Diferente de tudo que você já viu. Conheça o Nubank, https://www.nubank.com.br/, acessado em 24/10/2016) vem mostrando que os computadores já estão substituindo o trabalho realizado pelos bancários aqui no Brasil.

É preciso urgentemente rever os posicionamentos atuais e olhar com seriedade para o futuro do emprego e trabalho. O artigo “Bloqueio à internet no Brasil custou R$ 360 milhões” (http://www1.folha.uol.com.br/colunas/ronaldolemos/2016/10/1825554-bloqueio-a-internet-no-brasil-custou-r-360-milhoes.shtml, acessado em 24/10/2016) revelou o tamanho da perda que o Brasil teve com o bloqueio de serviços de valor agregado de internet. Foram 300 milhões de reais jogados no lixo. É a hora de repensar a CLT em face do mundo existente em 2016 para que ela comporte as novas formas de trabalho. O mundo mudou. Precisamos inclusive regulamentar como seria a exportação do trabalho para pessoas que estão fisicamente no Brasil.

É preciso que a questão do emprego e trabalho deixe de ser tratada como uma retórica teórica defendida com unhas e dentes através de manifestações na avenida Paulista e greves e vire uma solução real para os 166 milhões de brasileiros que estão em idade de trabalho. A realização da pior reforma trabalhista do mundo exige uma nova postura dos brasileiros. É preciso, por exemplo, cortar o acesso de fraudadores ao mercado de trabalho. Não existe maior fragilização do emprego do que um trabalhador ter que ler um roteiro mentiroso para os clientes para proteger a incompetência do seu empregador. Isto é humilhante.

Recentemente, eu entrei em contato com o atendimento de uma operadora de telefonia celular por causa da ativação de um serviço não solicitado e autorizado. Diante da minha afirmação sobre a ativação de um serviço não autorizado e solicitação e que não queria gastar o meu cancelando serviços que não solicitei (era caso recorrente), a atendente insistiu em afirmar que são ativados apenas os serviços solicitados pelos clientes. Em momento algum ela apresentou uma prova da afirmação que ela leu no seu roteiro de atendimento. Apenas leu um texto que estava em clara oposição ao fato relatado. Ela não apresentou nada que comprovasse a afirmação dela. Nem mesmo, a constatação do fato que o serviço nunca foi utilizado foi capaz de mudar a postura da atendente. Em qualquer lugar quem contrata um serviço, utiliza este serviço em algum momento. Quando um cliente que afirmou que não contratou um serviço, apresenta zero de utilização do mesmo, o bom senso deveria fazer que a atendente escale o assunto para o departamento de combate às fraudes e não mais repita um roteiro.


Eu não consigo enxergar maior fragilização do emprego do que um funcionário não poder falar a verdade para o consumidor para encobrir a incompetência do seu patrão. É preciso tratar deste tema com a devida seriedade na reforma da CLT.

Um comentário:

  1. E não é só em SAC, Central de Serviços e Telemarketing que isso acontece.
    Isto esta acontecendo também dentro das áreas da empresas no dia a dia.

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