terça-feira, 15 de janeiro de 2019

Desmaterialização da Moeda Soberana


O projeto de digitalização da moeda soberana de uma nação é um esforço que exige a identificação e comunicação dos benefícios tangíveis da iniciativa, por causa do seu elevado impacto no dia a dia das pessoas. A principal consequência do processo de desmaterialização da moeda é a criação da plataforma “Banco como um Serviço” (Bank as a Service – BaaS).

Em outras palavras, é de fundamental importância que o início dos trabalhos seja focado na identificação dos seus componentes e na determinação do custo total atual do dinheiro físico. O custo da utilização do dinheiro físico como meio de pagamento está distribuído nas etapas de:

1.     Produção e Emissão
2.     Custódia
3.     Distribuição para o atacado e varejo
4.     Transações realizadas

Os custos das transações realizadas com numerário físico estão relacionados com: (i) manutenção de um ou mais funcionários de confiança (são mais caros) para trabalhar como o dinheiro, (ii) vigilância remota dos caixas do varejo e caixas eletrônicos dos bancos, (iii) perdas causadas por erros operacionais na manipulação do dinheiro pelos funcionários, (iv) compra de maquinas contadoras de dinheiro por causa do elevado volume de notas movimentado (em geral ocorre nos bancos), (v) perda de tempo e produtividade por causa tanto da manutenção de dinheiro físico para troco no caixa, como do deposito diário no banco) do dinheiro do caixa (pode ocorrer várias vezes, (vi) segurança física e eletrônica por causa da permanente ameaça de roubo, (vii) aumento do valor do seguro por causa da presença de dinheiro físico no caixa, (viii) segurança extra para transportar o dinheiro até o banco, (ix) manutenção dos caixas eletrônicos abastecidos com dinheiro fora do expediente bancário e (x) redução da produtividade empresarial por causa do tempo gasto na contabilização manual do dinheiro do caixa.

Foi afirmado que o custo total anual do ciclo do dinheiro brasileiro é de aproximadamente R$ 90 bilhões, quando se considera a emissão, custódia, distribuição de atacado e varejo e os custos das tratativas com o dinheiro no comércio.
Fonte: Aldênio Burgos e Bruno Batavia (O Meio Circulante na Era Digital, autores:, https://www.bcb.gov.br/htms/public/inovtec/O-Meio-Circulante-na-Era-Digital.pdf?4, acessado em 09/01/2019).
  
A moeda digital aumenta a efetividade do sistema brasileiro de pagamentos porque é um meio de troca de baixo custo. Atualmente no Brasil, tanto as famílias de baixa renda, como as pequenas empresas dependem muito do numerário físico.

Os setores da sociedade com menor renda estão perdendo uma parte importante dos seus recursos financeiros, por causa do elevado custo do dinheiro físico ou das elevadas taxas para as transações realizadas com cartões pré-pagos. A realização de pagamentos com numerário digital oferece grandes benefícios para a população mais carente.

A adoção do Numerário Digital (ND) permite que sejam alcançados grandes ganhos de produtividade na macroeconomia nacional. Do ponto de vista da sociedade a digitalização da moeda soberana equivale a uma redução dos impostos.

A eliminação da necessidade do pequeno varejo de contratar um funcionário de confiança para manusear o dinheiro do caixa, em conjunto tanto com a eliminação das perdas para depositar e sacar o dinheiro no banco, como com a diminuição do risco de roubo reduz significativamente o custo operacional dos pequenos negócios.  O seguro contra roubo de uma loja é bem mais caro por causa da necessidade de manter numerário físico.

Os dispositivos adicionais de segurança dos caixas eletrônicos no Brasil, fazem com que eles sejam aproximadamente 65% mais caros do que os similares de outros países. Os boletos bancários pagos através dos caixas eletrônicos são uma das formas de pagamento na era digital. No entanto, um grande volume de boletos é pago em dinheiro físico na boca do caixa das agências bancárias.

A infraestrutura de pagamentos precisa ser interoperável na economia digital. É preciso que a emissão de moeda digital pelo Banco Central para as transações do varejo permita que os provedores de serviços de pagamento e transferência de diferentes locais e países trabalhem com liquidez em tempo real.

O numerário digital é, portanto, um “token" que assegura a liquidez do sistema de pagamentos em tempo real. A disseminação do uso da moeda digital soberana deve ocorrer em paralelo com o processo de obsolescência do numerário físico.

As principais consequências deste estratagema para a digitalização da moeda são o desencorajamento da evasão fiscal, o crescimento do grau de dificuldade para as operações de lavagem de dinheiro e a criação de barreiras para as atividades ilegais operacionalizadas pelas notas de grande valor do numerário físico.

Foi revelado pela consultoria A.T. Kearney que 36,5% do PIB brasileiro foi movimentado sem declaração adequada.
Fonte: Brasil tem o sexto maior mercado de trabalho informal, aponta levantamento, https://www1.folha.uol.com.br/colunas/mercadoaberto/2018/10/brasil-tem-o-sexto-maior-mercado-de-trabalho-informal-aponta-levantamento.shtml, acessado em 09/01/2019.

A economia subterrânea representa mais de 15% do Produto Interno Bruto brasileiro (Economia informal cresce pelo 4º ano seguido no país e corresponde a 16,9% do PIB, aponta estudo, https://g1.globo.com/economia/noticia/2018/12/04/economia-informal-cresce-pelo-4o-ano-seguido-no-pais-e-corresponde-a-169-do-pib-aponta-estudo.ghtml, acessado em 09/01/2019). A informalidade é uma importante fração da atividade econômica. É fácil perceber que a economia informal usa apenas dinheiro em espécie nas suas transações.

A moeda digital soberana é amiga da natureza. Ela elimina a necessidade de consumir na produção e distribuição do meio circulante físico diversas matérias primas e milhares de litros de combustíveis. As centenas de toneladas de resíduos geradas na etapa de produção do papel moeda e moedas não são geradas com a moeda digital.

O numerário digital elimina por completo, o problema da destruição do dinheiro físico que não tem utilidade. Em 2017, foram geradas quase mil e duzentas toneladas de resíduos de cédulas na destruição do numerário físico no Brasil.

Os meios digitais de pagamentos aumentam o nível de inclusão financeira da sociedade. É possível criar no universo digital uma infinidade de serviços financeiros com custo marginal unitário praticamente nulo. O fenômeno da inclusão financeira habilitada pelo numerário digital é consequência da eliminação das barreiras para a bancarização.

Muitas pessoas não possuem contas em bancos porque não existem agencias próximas ou da sua residência ou do seu local de trabalho (é muito comum este problema no campo). Uma grande parte da população pobre do Brasil não tem conta bancária por causa dos custos dos serviços.

Como a grande maioria dos brasileiros com idade acima de 15 anos tem acesso a um telefone inteligente ou a um computador com Internet é possível com a moeda digital soberana incluir no sistema financeira cerca de 35% da população que não é atualmente atendida pelos bancos.

Como a moeda desmaterializada elimina os intermediários do sistema de pagamentos é possível fazer a inclusão financeira com uma considerável redução de custos.

Por exemplo, são eliminadas as taxas cobradas pelos bancos nos canais eletrônicos de transferência de dinheiro (TEDs e DOCs). Neste novo mundo sem os bancos intermediando as transferências de numerário, ocorre a plena integração entre a população bancarizada com a não bancarizada.

Como o custo unitário marginal de uma transferência digital é praticamente zero, é possível estender o benefício para toda a população sem aumentar os gastos públicos. É viável com o numerário digital oferecer para a população de baixa renda a facilidade de transferir valores baixos.

Foi revelado que o custo de segurança cresceu tanto que inviabilizou o dinheiro físico em diversas cidades brasileiras.
Fonte: 'Novo Cangaço' deixa cidades do sertão da BA sem dinheiro, https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2018/07/novo-cangaco-deixa-cidades-do-sertao-da-ba-sem-dinheiro.shtml, acessado em 09/01/2019.

Os frequentes roubos de caixas eletrônicos e agências bancárias estão criando o fenômeno das cidades sem dinheiro (pequenas cidades no interior do Brasil onde não é possível fazer saque em dinheiro na agência e no caixa eletrônico).

As questões relacionadas com a segurança patrimonial e integridade física das pessoas (clientes, funcionários e população) estão inviabilizando a distribuição e armazenamento do numerário físico nas pequenas cidades.

Os custos de segurança estão crescendo com tamanha intensidade que os bancos estão concentrando os serviços bancários relacionados com o dinheiro físico nas agências de maior porte.

FIDO is the World’s Largest Ecosystem for Standards-Based, Interoperable Authentication.
Fonte: https://fidoalliance.org/about/what-is-fido/, acessado em 09/01/2019.

A moeda digital soberana não é isenta de incidentes de segurança. No entanto, o sistema integrado de processamento do pagamento, faz com que as fragilidades e ameaças de segurança cibernética possam ser resolvidas com um volume de investimento muito menor que o atual.

Como existem muitas pessoas trabalhando em paralelo nas soluções de segurança para os pagamentos digitais, os custos estão caindo dramaticamente. A FIDO Alliance desenvolve padrões para o ecossistema de pagamentos.

A moeda digital soberana continua sendo emitida pelo Banco Central (BC). A digitalização do numerário não prejudica a política monetária. As reservas bancarias do Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB) podem ser configuradas para que o seu acesso seja restrito.

Da mesma forma é também possível configurar a disponibilidade do numerário. O dinheiro digital pode ser configurado para que ele possa ser movimentado 24 horas por dia todos os dias do ano.

No entanto, também é possível configurar a disponibilidade do dinheiro das reservas bancarias. As movimentações podem ser realizadas apenas durante o horário de operação do Sistema de Transferência de Reservas (STR).

O numerário digital tanto pode ser estruturado em contas correntes, como pode ser organizado em tokens que armazenam valor. Nos dois casos, um cidadão enxerga a quantidade de dinheiro da sua carteira através do saldo da sua conta digital.

O Banco Central pode configurar a duração e o tempo de vida do numerário, pois é possível limitar a duração e o tempo de vida do dinheiro digital em função de eventos importante. Por exemplo, o sistema permite que o BC configure uma série do dinheiro digital para que ele seja criado, emitido e resgatado apenas durante a Copa do Mundo de futebol.

O dinheiro digital estruturado em contas correntes não é anônimo, pois o sistema acessa e controla as informações. Isto significa que a privacidade das movimentações é realizada através do sigilo do saldo e das movimentações.

No caso do dinheiro digital organizado em tokens, o anonimato pode ser configurado, pois é possível desenhar a arquitetura do sistema para que apenas o possuidor da chave privada tenha acesso ao saldo e as movimentações da sua conta.

A desvantagem, neste caso, é que a perda da chave privada implica em perda do dinheiro. A estrutura em tokens permite que o sistema digital seja configurado em diferentes níveis de privacidade.

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