sexta-feira, 7 de abril de 2017

Transformação digital em cinco passos simples

No primeiro trimestre de 2017 eu participei de diversas reuniões com empresários e executivos brasileiros sobre transformação digital. Eu fui surpreendido pelo nível superficial que o assunto está sendo tratado nas organizações no Brasil. Para a grande maioria das pessoas com quem eu conversei a transformação digital significa equipar a empresa com notebooks, tablets e smartphones (em vários casos as empresas planejam a sua transformação digital pela mera substituição dos desktops por estes dispositivos) e criar Apps, bancos de dados e big data.

Basicamente estas corporações estão realizando a consagrada e fracassada prática brasileira de fazer mudanças para que nada mude. Sempre que este fenômeno ocorreu as pessoas afirmavam que a tecnologia utilizada não funcionava na cultura da empresa. Temos centenas de exemplos de soluções que não funcionaram nas empresas brasileiras. Nestes casos as diversas tecnologias bem-sucedidas no exterior ficaram desacreditadas aqui no Brasil. Parece que a transformação digital nacional entrou na estrada do fracasso.

Quando os estrategistas dos negócios pensam que o mero investimento em hardware e software é condição necessária e suficiente para a transformação digital eles reduzem o assunto ao famoso mais do mesmo, ou seja, mudar para que ficar igual. A tecnologia não é a protagonista da transformação digital. Este papel é reservado para a qualificação dos funcionários.

O primeiro passo para a transformação digital é a redefinição do escopo do negócio. É uma decisão que responde a uma necessidade do ambiente de negócios. A estratégia em uso no Brasil de focar a transformação digital em ativos de tecnologia não tem sentido prático. Simplesmente inexiste razão e relação positiva entre o benefício e o custo para empreender tantas mudanças na empresa se o escopo do negócio é o mesmo.


O caso da divisão de iluminação da Philips ilustra bem este fenômeno. A empresa é uma das maiores fabricantes mundiais de lâmpadas elétricas. No início eram lâmpadas de filamento que duravam alguns meses (na escola um professor meu afirmava que o vácuo das lâmpadas era imperfeito para que elas queimassem rapidamente). Na segunda fase vieram as lâmpadas fluorescentes que duravam cerca de um ano e na terceira fase da indústria vieram as lâmpadas de led que duram vários anos.

A Philips percebeu que tinha um grave problema no médio e longo prazo pois a elevada durabilidade das suas lâmpadas de led irá reduzir no futuro próximo demanda mundial por lâmpadas. No primeiro movimento desta percepção a empresa resolveu agregar valor as suas lâmpadas led adicionando funcionalidades como novas cores, sensores de calor e de fumaça, câmeras de vídeo e etc. Como a solução proposta de maior valor agregado não resolve o problema de redução futura do consumo por causa da elevada durabilidade do produto, a Philips resolveu fazer um segundo movimento que neste caso foi na direção da transformação digital.
A organização percebeu que os seus clientes não querem comprar lâmpadas. Eles querem comprar um sistema de iluminação que funcione. Shoppings, aeroportos, edifícios comerciais e etc. querem pagar para ter iluminação. A Philips percebeu que ela precisava redefinir o escopo do seu negócio de fabricante de lâmpadas para fornecedora de um sistema de iluminação como um serviço. Esta mudança desmaterializou os seus produtos e permitiu a sua digitalização.

Ela continua atuando como fabricante de lâmpadas mantendo assim todo o seu legado de conhecimento e ativos e virou uma operadora de sistema de iluminação como um serviço. É evidente que fabricantes de automóveis, moveis e etc. podem trilhar caminho similar ao da Philips. Com a mudança no escopo do negócio a empresa executou o primeiro dos cinco passos para a transformação digital.

O segundo passo para a transformação digital é encontrar as fontes de valor agregado para o negócio que estão escondidas pelo modelo analógico de negócio. A Philips encontrou um grande mercado que ela pode explorar como o modelo sistema de iluminação como um serviço. Ela transformou a receita incerta de vender lâmpadas para a receita certa e recorrente de vender serviços de iluminação para hospitais, aeroportos, shoppings e etc. As receitas futuras foram antecipadas com a desmaterialização dos produtos.

O terceiro passo para a transformação digital é a construção de um modelo de negócio baseado no custo totalmente variável pelo compartilhamento dos ativos e na repartição do lucro gerado pelas operações entre todos os integrantes da rede. Em outras palavras, as infraestruturas individuais de cada um dos integrantes da rede são compartilhadas entre os membros da cadeia de valor e o lucro gerado pela operação comercial é repartido. É um modelo que oferece grande flexibilidade e escalabilidade, reduz custos, volatilidades e riscos e maximiza o retorno do investimento nos ativos.

A Philips vem trabalhando com a sua cadeia de valor para que os sistemas de iluminação como um serviço sejam entregues na situação de endereçamento das necessidades dos clientes. A rede construída com empresas de todos os tamanhos permite que clientes de todos os portes e locais sejam atendidos adequadamente. O monitoramento integrado, descentralizado e remoto do sistema de iluminação permite que todos os membros da cadeia saibam quando devem atuar e o que devem realizar.

A estrutura em rede permite o crescimento em velocidade exponencial da operação sem que exista o comprometimento da viabilidade econômica dos membros da cadeia de valor.

O quarto passo para a transformação digital é o desenvolvimento de como um serviço. Em vez de vender automóveis, eletrodomésticos e etc. as empresas passam a vender os serviços que são realizados pelos produtos. As pessoas não querem com maquinas de lavar roupa e secadoras, elas querem roupas limpas. Os consumidores não querem comprar automóveis, eles querem mobilidade. Existem milhares de casos onde as pessoas querem os serviços realizados pelos produtos. Não os produtos.

A Philips fez a sua lição de casa ao criar o serviço de iluminação como um serviço. Existe um mercado potencial gigantesco para esta modalidade. É uma grande solução para shoppings, aeroportos, hospitais, condôminos e etc. não ter que se preocupar com lâmpadas. As empresas que contratam a Philips para trabalhar o sistema de iluminação podem focam as suas energias nas suas atividades principais de negócio e deixar para um especialista a gestão da iluminação.

O quinto e último passo para a transformação digital é pensar os produtos ofertados como uma plataforma. O envolvimento da comunidade é de importância fundamental para o sucesso da empreitada digital. Por exemplo o retorno dos passageiros do aeroporto sobre as falhas na iluminação permite que a Philips economize milhões de dólares por ano em ferramentas sofisticadas de monitoração do ambiente iluminado. Muitos sensores podem ser substituídos pela colaboração da comunidade que informa onde existe excesso ou falta de iluminação.


Este ponto exige que a empresa use a sua credibilidade e confiabilidade no engajamento das pessoas em torno de uma causa. O Massive Transformative Purpose (MTP) é a cola que une empresa e comunidade em torno de um objetivo comum. A Philips trabalha o seu MTP para que todos busquem o objetivo de iluminar adequadamente o ambiente com o menor custo possível para a natureza. 

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