Os chamados produtos inteligentes conectados são a principal consequência da era dos aplicativos ou da economia dos Application Programming Interfaces (APIs). Daqui há alguns anos teremos o questionamento sobre quem nasceu primeiro? O produto inteligente conectado ou o aplicativo? Em 2015 é muito fácil responder que quem nasceu primeiro foi o Smart Connected Product. Primeiro nasceram os smartphones e depois vieram os aplicativos. Os primeiros smartphones como o HTC Touch com sistema operacional Windows Mobile 6.0 Pocket PC Professional eram limitados em termos de aplicativos e conectividade. Após o lançamento do iPhone em 2007 o cenário mudou completamente. Foi o início da era dos aplicativos.
Os produtos inteligentes conectados vieram à superfície com intensidade na segunda década do século XXI. Produtos como televisores, carros, lâmpadas, geladeiras, lavadoras, colheitadeiras e etc. viraram smart ou inteligentes. Se no início existia apenas o smartphone, agora temos produtos da linha smart como smartTV, o smartcarro, a smartpanela, entre outros. Estas mudanças não foram apenas cosméticas, elas implicaram em uma profunda mudança na estratégia competitiva das empresas. As firmas contam agora com produtos cujo o hardware é inteligente através de sensores e processamento e é cada vez mais padronizado (custo marginal por unidade produzida cada vez menor). O valor agregado do smart connected product para o cliente está, no software. Para os fabricantes, o software dos produtos é o diferencial competitivo.
Em outras palavras, a indústria de todos os setores está deixando de ser uma produtora de hardware para ser uma desenvolvedora de software. É uma transformação radical, porque a produtividade da mão de obra do hardware é visível e contável e a do software é invisível e incontável (pelo menor diretamente). Não é possível na era do conhecimento do software saber exatamente se o desenvolvimento dos produtos está na capacidade máxima da organização ou se existe alguma ociosidade. Na era do conhecimento é preciso existir um novo formato de liderança que seja capaz de conquistar os funcionários.
A manutenção que antigamente era apenas das peças desgastadas ou defeituosas muda com a necessidade de análise da configuração do produto e do seu software. É preciso um nível de capacitação muito maior para sobreviver neste novo mercado. Os produtos inteligentes conectados vão lançar o desafio aos fabricantes de conviver com diversas versões de sistema operacional e aplicativos (fabricantes de computadores vivem este desafio por décadas). O hardware padronizado vai por conta das versões, configurações e sensores criar centenas de variações para o mesmo produto.
Como os consumidores também tem elevado nível de criatividade, muitas aplicações do smart connected product que não foram previstas ou planejadas vão submergir e desafiar os fabricantes. Se os milhares de sensores serão capazes de realizar tarefas de manutenção preventiva e diagnóstico, eles também vão demandar por maior conhecimento dos analistas do call center. A grande quantidade de opções vai exigir que o perfil profissional seja de uma pessoa objetiva e centrada na necessidade específica do cliente.
Acabou a era do call center padronizado via scripts previamente definidos. Os produtos inteligentes conectados vão gerar diferenciações importantes. E por causa disto vão provocar incertezas onde existiam certezas. Um melhor atendimento pós-venda vai ser capaz de gerar mais vendas. Uma maior pobreza intelectual corporativa do call center vai afetar negativamente o faturamento. Não serão centavos, mas milhões ou bilhões de reais. Um analista de call center que for capaz de identificar uma solução de contorno enquanto o cliente espera a resolução do problema vai ser disputado intensamente pelas empresas. Como já não existem barreiras geográficas para este tipo de serviço, o mercado de trabalho será globalizado em um nível muito acima do que conhecemos atualmente.
O conhecimento dos diversos perfis de uso do equipamento inteligente vai fazer a diferença comercial e empresarial na era do conhecimento. Não serão soluções robotizadas ou padronizadas que vão atender as necessidades dos clientes. Vai ser preciso fazer muito mais do que isto. As empresas precisarão cada vez mais de bases de conhecimento eficazes e eficientes que os analistas vão terão que dominar. Tao importante quanto saber uma resposta será saber onde encontrar a resposta correta. Não existe mais espaço para soluções de base de conhecimento do call center onde apenas 15% dos itens de conhecimentos são utilizados. O universo conspira e exige números bem maiores para o Knowledge-Centered Support (KCS).
É claro que os produtos inteligentes conectados vão exigir novas soluções de segurança. Onde os dados dos sensores ficarão armazenados? Dentro do equipamento ou em uma nuvem ou em ambos? Existirão demandas por backup e restore? Quem vai analisar os logs do firewall? Produtos conectados exigem a presença de uma barreira de fogo contra ameaças externas. Já existem diversos relatos de problemas de segurança em carros e aviões causados por vulnerabilidades no software.
O artigo “Falha em software exige recall de 65 mil carros da Jaguar Land Rover” (http://computerworld.com.br/falha-em-software-exige-recall-de-65-mil-carros-da-jaguar-land-rover, acessado em 03/08/2015) revelou que as portas abriam sozinhas. O artigo “Carro inteligente é alvo fácil de hackers, diz relatório” (http://veja.abril.com.br/noticia/vida-digital/hackers-conseguem-invadir-quase-todos-carros-conectados-do-mercado/, acessado em 03/08/2015) revelou que a maioria dos carros conectados na internet são vulneráveis aos ataques dos hackers. O artigo “Invasão de sistema de avião por hacker ressalta problemas mais graves da indústria (http://tecnologia.uol.com.br/noticias/reuters/2015/05/25/invasao-de-sistema-de-aviao-por-hacker-ressalta-problemas-mais-graves-da-industria.htm, acessado em 03/08/2015) que um avião conectado foi invadido.
É evidente que a demanda por segurança nos produtos inteligentes conectados será crescente e terá que ser atendida em algum nível pelo call center. O nome da organização poderá mudar para service desk ou central de atendimento, mas mudando ou não mudando de nome, o call center vai mudar de atuação e de importância corporativa.
Na realidade da era dos aplicativos, as empresas que vendiam colheitadeiras são agora vendedoras de software. A cadeia produtiva da firma muda de sentido nesta transformação. A cadeia regida pelas entradas, operações, saídas, marketing e vendas e pós-vendas passa a ser influenciada pelas informações internas e externas. Por exemplo, a entrada do fabricante vai precisar considerar componentes que até pouco tempo não faziam parte dos insumos necessários para a produção. É preciso ter como entrada no processo produtivo o acesso dos clientes e os dados capturados. A dimensão da informação foi anexada ao processo produtivo para que os clientes recebam um produto que enderece a sua necessidade.
A operação vai realizar a montagem dos diversos componentes e sensores em um único equipamento em função da configuração definida no processo de venda. Em breve teremos migrações de equipamentos inteligentes antigos para novos e será preciso contemplar o histórico. Não será muito diferente da troca em 2015 de um computador. O novo equipamento herda via restore as informações do computador antigo.
O marketing, vendas e pós-vendas serão integrados em um único espaço virtual em função das informações de uso, manutenção e etc. Linhas de equipamentos serão integradas em sistemas maiores para suprir as necessidades dos clientes. No caso das fazendas que usam mais do que colheitadeiras, elas serão integradas em um sistema maior que usará informações dos sensores externos ao equipamento sobre a previsão do tempo, temperatura, velocidade e direção dos ventos, sistema de irrigação, preço atual e futuro da safra, fertilização da terra, otimização das sementes e etc.
Estamos falando de uma nova camada de software que vai planejar a operação da fazenda com base nas informações capturadas pelos diversos equipamentos. Os sensores das colheitadeiras, irrigadoras, fertilizadoras e etc. vão formar uma rede muito parecida com uma rede de computadores para formar um sistema dos diversos sistemas inteligentes. A colheitadeira inteligente que integra o sistema pode alimentar o sistema com informações sobre o solo e agregar mais um valor para o fazendeiro. É o mesmo hardware oferecendo informações extras via sensores. O mecanismo de competição entre os diversos fabricantes de colheitadeiras fica profundamente alterado com as máquinas inteligentes conectadas.
O modelo de cinco forças competitivas do Michael E. Porter revela que os smart connected products mudam completamente a lógica da competição empresarial. O poder de barganha dos compradores é combatido pela diferenciação do produto que leva a negociação para um patamar acima do preço. Ao conhecer como os consumidores usam o produto, o fabricante pode oferecer níveis de customização ainda maiores e aumentar o valor agregado. A rivalidade entre os concorrentes passa a ser decidida pela diferenciação e valor agregado. É possível oferecer produtos customizados para clientes individuais com preço competitivo. A ameaça de novos entrantes é combatida por uma elevada estrutura de custo fixo causada pela complexidade do produto inteligente e pelas diversas camadas de tecnologia. A ameaça de produtos substitutos é combatida pelo desempenho superior do produto customizado e pela dificuldade de migar a base de dados do uso histórico do produto para um novo fabricante. O poder de barganha dos fornecedores é combatido pelo elevado valor que o software tem em relação aos componentes físicos padronizados. Existem casos os componentes físicos podem ser substituídos por módulos de software.