quinta-feira, 23 de abril de 2015

Novo 7 a 1

A corrupção é apontada pela maioria dos brasileiros como a principal causa da pobreza nacional. Muitos querem auditorias na dívida pública e outras medidas para recuperar as perdas pela corrupção e resolver os problemas dos brasileiros. O balanço recém divulgado pela Petrobras (Com perdas em corrupção, Petrobras tem prejuízo de R$ 22 bi em 2014, http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/04/1619695-com-perdas-em-corrupcao-petrobras-tem-prejuizo-de-r-21-bi-em-2014.shtml, acessado em 23/04/15) é uma ferramenta bastante didática para revelar o tamanho do problema da corrupção e da falta da engenharia.

O balanço revelou perdas por corrupção de 6,194 bilhões de Reais e perdas por reavaliação de ativos de 44,345 bilhões. Perdas por reavaliação de ativos significam na linguagem da rua que a empresa gastou dinheiro bom em projetos ruins e perdeu dinheiro, ou seja, o projeto gerou um resultado financeiro menor do que foi gasto para a sua realização. Este é um caso típico de engenharia pobre ou ausente. Faz parte da engenharia a avaliação financeira e econômica de um projeto para que o mesmo gere um resultado positivo (no popular é mais dinheiro no bolso). É claro que podem existir projetos de resultado negativo no portfólio que são estratégicos e por causa disto são aprovados.

Eles são apresentados com transparência no plano de negócios da empresa e são justificados com argumentos não financeiros. No entanto, este não é o caso da Petrobras. Os projetos não eram estratégicos eram apenas ruins. A falta da engenharia causou uma perda de 44,345 bi contra 6,194 bi da corrupção, ou seja, o custo da destruição da engenharia brasileira é sete vezes maior que o da corrupção. Para que se tenha ideia do tamanho da perda pela destruição da engenharia, o tamanho do ajuste fiscal do país inteiro é de 66,3 bi (Governo lançará campanha publicitária sobre o ajuste fiscal, http://www1.folha.uol.com.br/poder/2015/04/1613097-governo-lancara-campanha-publicitaria-sobre-o-ajuste-fiscal.shtml, acessado em 23/04/15). Sem as perdas da falta de engenharia de apenas uma empresa, o ajuste cairia para 21,955 bi, ou seja, redução de 66%. Imagine o ganho que o Brasil teria mantendo uma engenharia rica na Petrobras e Eletrobrás? São apenas duas empresas. Provavelmente o ajuste fiscal de arrocho salarial e perda dos direitos trabalhistas seria evitado.

É evidente nos números que o ator protagonista da pobreza brasileira é a falta da engenharia, a corrupção é uma estrela de sexta grandeza. Da mesma forma que existiram perdas pela falta de engenharia na Petrobras, elas também estão presentes na Eletrobrás (conta de luz subiu mais de 40%), nos hospitais, nas escolas e etc. Não devemos entender que as perdas pela destruição da engenharia acontecem apenas no governo e nas empresas estatais. Elas estão presentes nas empresas privadas com grande intensidade. Eu já avaliei milhares de projetos com falhas graves de engenharia e com retorno negativo. Basta olhar para as obras civis, farmácias, restaurantes e etc. que vamos encontrar operações altamente ineficientes e caras. Este é na realidade o real custo Brasil.


São centenas de bilhões de reais jogados no lixo anualmente por causa de uma engenharia pobre. O país poderia estar muito mais próximo da riqueza da Coréia do Sul ou Cingapura ou outro emergente se tivesse levado à sério o problema da engenharia. Espero que o balanço da Petrobras ilumine a cabeça dos brasileiros para o real problema que causa a pobreza nacional. Como lembrete final as perdas pela destruição da engenharia foram de 44 bi enquanto as perdas pela corrupção foram de 6 bi. Destruição da engenharia 7 x corrupção 1. Mais uma derrota de 7 a 1 do Brasil.

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Terceirizações

Apesar de já ter escrito sobre terceirizações em diversos momentos, muitos estão perguntando o que eu acho sobre o projeto de lei (PL 4330) que estabelece um novo entendimento sobre as terceirizações no Brasil. Eu entendo que o atual projeto de lei teria sido muito útil no Brasil de 1990. Como estamos em 2015, a proposta é mais uma perda de tempo da sociedade brasileira. Após a votação do projeto que está caminhando cada vez mais para o “nós contra eles”, teremos um lado vencedor e um perdedor. Provavelmente, o Brasil vai passar décadas discutindo a lei das terceirizações. Mais uma vez reforço que em 1990 o PL poderia ter sido útil, no entanto em 2015 ele é inútil e ultrapassado.

O Brasil deve focar os seus parcos esforços em discutir porque o crescimento do PIB é tão pífio. Não existem recursos para discutir inutilidades. Para os que não perceberam o mundo mudou para o modelo “como um serviço” graças a economia dos aplicativos. O sentido de discutir terceirizações na área fim de uma empresa é nulo. Infelizmente muitos despreparados estão com voz ativa no debate do projeto de lei e estão propagando falácias como benefícios da lei da terceirização (“A terceirização gera empregos ou precariza relações de trabalho?”, http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2015/04/150413_terceirizacao_entenda_ru, acessado em 22/04/15). Porque o nível de emprego aumentaria? Se os graves problemas da economia brasileira não forem resolvidos o país não cresce. Transferir empregos da empresa para a empresa terceirizadora não altera o nível de emprego.

Os problemas educacionais que travam a produtividade da economia não serão resolvidos com a terceirização. Em outras palavras, a proposta do projeto de lei não é capaz de mudar o nível de emprego. Nem para cima, nem para baixo. A redução de custo propagandeada por alguns é bastante questionável. O avanço da competividade sugerido pelos defensores da lei foge de qualquer análise logica. O Brasil não é competitivo no exterior porque os produtos e serviços apresentam qualidade e qualificação bem abaixo da chinesa por exemplo. O mesmo acontece no mercado interno. A China derrotou o Brasil dentro e fora do país porque foi capaz de realizar uma engenharia capacitada. O Brasil perdeu mercados pela destruição da engenharia nacional. Não é o custo do trabalho o problema. Isto significa que a lei das terceirizações não vai resolver este problema. É só mais uma falácia contada pelos que desconhecem a realidade brasileira.

Não é difícil identificar os que desconhecem a realidade e afirmam que a lei das terceirizações resolvem os problemas. O respeitável colunista Samuel Pessôa publicou o artigo “A lei da terceirização é positiva” no jornal folha de São Paulo em 19 de abril de 2015 (http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mercado/216567-a-lei-da-terceirizacao-e-positiva.shtml, acessado em 22/04/15). No artigo ele afirmou: “O projeto de lei 4.330 tem por objetivo permitir que empresas especializadas em colheita e outras especializadas na aplicação de inseticidas, e assim sucessivamente, possam ser criadas.”. Ele estabeleceu uma série de relações negativas para a economia brasileira em função da atual impossibilidade de existir uma empresa que aplique inseticida como um serviço.

Infelizmente os problemas e respectivos benefícios da lei das terceirizações citados não são corroborados pela realidade nacional. Ele afirmou que um agricultor não pode atualmente contratar uma empresa especializada na aplicação de inseticida porque o arcabouço legal não permite e apenas com a nova lei isto será possível e a economia vai ganhar.

O mesmo jornal folha de São Paulo publicou em 2011 o artigo Citricultores de SP rateiam custos com pulverização (http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mercado/me2607201119.htm, acessado em 22/04/15) revelando que os agricultores contrataram pulverização como um serviço sem ferir a legislação trabalhista vigente (O texto do artigo era: “Os citricultores da região de Araraquara e São Carlos, a de maior incidência do greening em São Paulo, estão formando "consórcios" para ratear os custos do combate à doença, que provoca perda da qualidade da fruta.”). Em outras palavras os ganhos de produtividade alegados como benefícios pela lei das terceirizações já estão presentes na economia nacional.

Todos os outros casos citados pelo articulista são possíveis no arcabouço legal atual e alguns deles como o caso das colheitadeiras e pulverizações já existem. O mundo como um serviço é parte integrante da realidade brasileira. Isto significa que os casos inexistentes não são consequência de restrições legais, mas sim de um ambiente que inviabiliza este tipo de empreendimento. Apesar das inconsistências com a realidade nacional, o texto aponta para um ponto crucial da falta de competividade nacional e que deveria ser alvo de análise por articulistas respeitáveis como o Samuel. Ele apontou no texto citar as dificuldades do uso compartilhado de recursos. A raiz do crescimento dos EUA pós crise de 2008 é a “sharing economy” ou economia do compartilhamento. Em vez de perder tempo com um projeto de lei ultrapassado seria melhor resolver as barreiras existentes para o compartilhamento.

Isto sim traria os benefícios propagandeados pelos defensores da lei da terceirização. A questão da falta de competividade pela ausência de engenharia pode ser facilmente percebida na produção da Apple no Brasil. Apesar de todas as desonerações, incentivos e etc. (Brasil terá smartphone até 25% mais barato no fim do ano, diz ministro, http://g1.globo.com/economia/noticia/2012/09/brasil-tera-smartphone-ate-25-mais-barato-no-fim-do-ano-diz-ministro.html, acessado em 22/04/15) o iPhone 6 mais caro do mundo é produzido no Brasil (Brasil tem o iPhone 6 mais caro do mundo, aponta pesquisa, http://computerworld.com.br/brasil-tem-o-iphone-6-mais-caro-do-mundo-aponta-pesquisa, acessado em 22/04/15). Como o custo da mão de obra é muito mais caro na Alemanha, França, Estados Unidos e etc. que no Brasil fica claro que o problema de custo elevado não é resultado do custo da mão de obra. Ou seja, mais uma vez os fatos provam que o problema da competitividade não será resolvido com a lei da terceirização. Ela simplesmente não produz este benefício alegado pelos especialistas.

A maior demonstração de falta de conhecimento da realidade está no artigo “A terceirização gera empregos ou precariza relações de trabalho?” (“Tanto Peluso quanto Salvato acreditam que a possibilidade de as empresas terceirizarem suas atividades pode ajudá-las a se tornar mais eficientes. Segundo eles, isso seria verdade tanto para a terceirização das atividades-meio - por exemplo, a segurança, a limpeza e os serviços de TI - quanto das atividades-fim.”). Os especialistas consideraram os serviços de TI como área meio dos negócios. Neste ponto reside o maior problema e solução dos desafios nacionais. O artigo “Gartner diz que, agora, 'todas as empresas são empresas de tecnologia'” (http://idgnow.com.br/ti-corporativa/2013/12/19/gartner-diz-que-agora-todas-as-empresas-sao-companhias-de-tecnologia/, acessado em 22/04/15) e “Gartner: nenhuma indústria passará ilesa à revolução digital” (http://computerworld.com.br/gartner-nenhuma-industria-passara-ilesa-revolucao-digital, acessado em 22/04/15) revelam os serviços de TI são área fim de todas as empresas. Claramente, a terceirização de TI em nada contribuiu para o avanço das empresas brasileiras nos últimos anos. Desde o nascimento da era dos aplicativos na década passada praticamente nada foi conquistado pelos empreendimentos nacionais em termos de mercado mundial. A falta de engenharia é o fator chave do problema produtividade.

Eu não sou contra a terceirização. Ela pode ser um enorme aliado para trabalhadores e empresários. No entanto, o PL 4330 é só uma lei do atraso. O Brasil está perdendo um tempo precioso ao discutir algo que deveria ter sido analisado em 1990. Em 2015 estas conversas são inúteis. Espero que o congresso acorde e olhe em que ano estamos. Não é preciso ser nenhum Einstein para perceber que existem falhas elementares e graves em todos os negócios do Brasil. Se um décimo da energia gasta na lei das terceirizações fosse gasto na eliminação de erros básicos o país sairia rapidamente do drama do pibinho

quarta-feira, 1 de abril de 2015

Como sair do PIBINHO para o PIBÃO?

Como todos sabem o ano de 2014 foi de crescimento pífio do PIB brasileiro (“Economia brasileira cresce 0,1% em 2014, pior resultado em 5 anos, diz IBGE”, http://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2015/03/27/pib-2014.htm, acessado em 01/04/2015). No entanto, existem setores que escaparam das garras do governo do PIB mínimo. Um deles é o comércio eletrônico. Os dados consolidados revelam que o crescimento do e-commerce foi digno de um país de PIB máximo como a China (26%. Fonte: “Brasil.com.br, que País é esse?”, http://computerworld.com.br/brasilcombr-que-pais-e-esse, acessado em 01/04/2015).

O que gerou efeito tão espetacular em uma economia tão deprimida? Um dos motivos é a estatística. Como a base não é tão grande é possível crescer com força com um nível básico de acerto empresarial. Não tem sentido avançar neste aspecto, porque ele é um mero efeito aritmético. O segundo motivo do crescimento é bem mais interessante. O Brasil é um país com graves problemas distributivos e por conta disto existem cidades que sequer tem uma banca de jornal. O comércio eletrônico está avançando no país, porque ele consegue oferecer produtos e serviços inexistentes em diversos lugares. Na medida de velocidade do avanço da banda larga, o e-commerce vai crescendo. Como as carências nacionais geraram uma enorme demanda, existe um espaço de crescimento gigantesco para o comércio digital.

O mundo virtual permite comparações instantâneas de preços e disponibilidades e por causa disto pode corrigir distorções do mundo físico. Um exemplo atual mostra porque o negócio digital é capaz de crescer exponencialmente. Com a epidemia da dengue em São Paulo em 2015, os estoques de repelentes do mosquito ficaram esgotados nas farmácias da capital paulista. Como a epidemia não está presente nos estados do sul do Brasil, muitos paulistas estão comprando os repelentes nas lojas de Porto Alegre (“Avanço da dengue cria corrida por repelentes em SP”, http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2015/03/1609533-avanco-da-dengue-cria-corrida-por-repelentes-em-sp.shtml, acessado em 01/04/2015). Sem o negócio digital, seria muito difícil e caro realizar tais transações. Se a digitalização do negócio tem este impacto no crescimento do país, então porque não existem políticas públicas de facilitação da criação deste ambiente?

Com toda a sinceridade eu não consigo entender e responder esta pergunta. Parece que é óbvio, mas desde o início efetivo da digitalização do negócio em 2008, o governo do Brasil vem ignorando por completo o potencial econômico deste novo formato de fazer negócios. Nem mesmo o consistente crescimento expressivo do setor consegue sensibilizar o governo nacional. A única movimentação organizada foi o Marco Civil de Internet que exige diversas regulamentações não feitas e já tem defensores da não regulamentação de esquisitices propostas na lei aprovada (“Como regulamentar o Marco Civil?”, http://www1.folha.uol.com.br/fsp/tec/214157-como-regulamentar-o-marco-civil.shtml, acessado em 01/04/2015)

O Brasil ainda não percebeu que o país criou uma armadilha para o seu crescimento ao promover uma enorme concentração de pessoas em São Paulo. O processo de concentração iniciado nos anos 1960 resultou em mais de 20% da população residindo em cerca de 3% do território nacional. Os recursos naturais estão sendo exauridos ao mesmo tempo que o desenvolvimento de 97% do país está sendo inibido. A concentração em São Paulo leva a situação perversa onde o desenvolvimento está focado em uma região com razoável nível de avanço, pois a grande massa potencializa o lucro e a maior parte do território nacional tem que duelar ferozmente para conseguir algum desenvolvimento. o principal motivo de cidades razoavelmente populosas não terem uma banca de jornal está profundamente relacionado com esta absurda concentração populacional. O atual partido no poder além de nada fazer para resolver o problema da concentração, faz o oposto: Incentiva a concentração e restringe o crescimento do PIB brasileiro.

A digitalização dos negócios tem a propriedade de mudar esta dinâmica. É possível agora estabelecer uma banca de jornal em uma cidade pequena e expandir o negócio para as cidades próximas pela Internet. Em diversos lugares do Brasil já existem as condições de infraestrutura. O que está faltando é a capacitação. E não é apenas para banca de jornal. É possível avançar em áreas complexas como a medicina. Já é possível fazer exames oftálmicos via remota em tempo real. Neste modelo, a infraestrutura é uma perna e a capacitação é a outra.

Para resolver o problema da capacitação, o governo pode adotar medidas simples e coerentes como pactuar no contrato do fies a obrigatoriedade de trabalhar em local determinado pelo estado por cinco anos. É uma forma inteligente e justa de resolver o problema de concentração populacional em São Paulo ao mesmo tempo em que leva capacitações para as pequenas cidades. A consequência da melhor distribuição do conhecimento é um rearranjo econômico que é capaz de produzir um ciclo de crescimento sustentável de longo prazo para o PIB brasileiro. O governo Dilma 2 está com a faca e o queijo na mão. É só ter a competência de fazer acontecer.