segunda-feira, 28 de março de 2016

Produtividade Total dos Fatores (PTF)

Produtividade Total dos Fatores

Toda vez que o Brasil entra em crise ou em recessão profunda os temas produtividade, custo Brasil e flexibilização das leis e benefícios trabalhistas entram em ebulição na pauta da agenda nacional. Desde os anos 1980 estes três assuntos estão sendo discutidos e até o ano de 2016 inexistem respostas concretas e realistas.

Apesar do gigantesco volume de conversas inexistem acordos e consensos. Sugestões antigas são reapresentadas com novos formatos e são proferidos à exaustão discursos catastrofistas como “O Brasil vai quebrar sem as reformas (previdência social, leis trabalhistas e legislação tributária)”. Na pratica o discurso focado no medo não vem gerando consenso na sociedade. Como já ocorreu no passado, muito está sendo dito e nada acontece. As pessoas simplesmente “não compram” as propostas que são apresentadas como solução dos problemas nacionais. Em outras palavras, o Brasil entrou em “loop” nos aspectos relacionados com a produtividade da economia.

A leitura do artigo do principal evangelista do Service Desk no Brasil intitulado “Zeus e a Produtividade: sua capacidade divina de assumir várias formas” (http://www.4hd.com.br/blog/2016/03/23/zeus-e-a-produtividade-sua-capacidade-divina-de-assumir-varias-formas/, acessado em 28/03/2016) revelou que apesar de antigo, o conceito da Produtividade Total dos Fatores (PTF) ainda não foi incorporado nas conversas. O meu primo de Porto Alegre que resolveu recentemente embarcar no iate da produtividade vai reclamar e protestar.

Como todos sabemos a produtividade é o quociente entre o resultado alcançado e o esforço realizado considerando os recursos utilizados. Muitos simplificam esta equação considerando no denominador apenas os esforços e recursos físicos. Esquecem de levar em conta os valores imateriais. O resultado deste esquecimento é que muitos concluem que para aumentar a produtividade é preciso ou aumentar os resultados alcançados (por exemplo através de aumento de preços) ou reduzir a quantidade do esforço físico realizado considerando os recursos utilizados. A apresentação de apenas duas possibilidades é uma falácia que vem sendo repetida por muitos há muitos anos.

É preciso considerar o capital intelectual ou conhecimento na equação da produtividade. A PTF entra no jogo porque o capital intelectual faz muita diferença. Para exemplificar porque a produtividade total dos fatores pode representar até 60% do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de um país vou desvendar um caso bem simples e comum. Eu e o meu vizinho temos uma propriedade rural. A comparação de cada um dos átomos físicos destas duas fazendas e dos recursos para a produção revela absoluta igualdade. No entanto, apesar das igualdades físicas o meu vizinho termina a preparação do terreno um mês antes do que eu.

É fácil perceber que a produtividade dos esforços e recursos utilizados impacta o resultado final da produtividade. O meu vizinho consegue este resultado superior porque ele mapeou todo o terreno e planeja antecipadamente cada ação da sua preparação. Como eu não tenho este capital intelectual ou conhecimento eu saio para o campo com o trator com um determinado garfo e no meio do trabalho descubro que naquele pedaço do terreno eu preciso de um garfo diferente. Isto me obriga a retornar e trocar de garfo. Eu perco muitas horas realizando este procedimento. O meu vizinho que conhece em minucias o perfil do terreno, planeja as suas ações para sempre sair de casa com o garfo certo conectado no trator. O conhecimento faz toda a diferença para a produtividade.

O artigo “Produtividade e Armadilha do Lento Crescimento” (https://fernandonogueiracosta.wordpress.com/2015/04/14/produtividade-e-armadilha-do-lento-crescimento/, acessado em 28/03/2016) revelou que o Brasil padece do mesmo mal que vem fazendo a minha fazenda ser menos produtiva que a do meu vizinho. Os exemplos revelam que não sou o único que esqueceu da produtividade total dos fatores. O artigo “Baixa produtividade da construção compromete remuneração do trabalho” (http://www.fiesp.com.br/observatoriodaconstrucao/noticias/baixa-produtividade-da-construcao-compromete-remuneracao-do-trabalho/, acessado em 28/03/2016) revela o problema da baixa produtividade na construção civil no Brasil.

No texto foi afirmado que entre 2000 e 2013 a produtividade do trabalho na construção civil ficou estagnada. Ou em outras palavras, considerando toda a evolução tecnológica que ocorreu no período, a produtividade da mão de obra foi negativa. Os trabalhadores não conseguiram conquistar benefícios de produtividade com as novas tecnologias introduzidas na construção civil. Em 2013, cada trabalhador da construção civil brasileira gerou valor agregado de US$ 18.900. O valor médio dos 29 países analisados foi de US$ 57.800. Como consequência da estagnação de uma produtividade que era baixa, a remuneração do trabalhador brasileiro é a menor entre os 29 países avaliados. Em outras palavras a menor remuneração gerou como resultado o pior valor agregado.

A conclusão final é que o Brasil apresenta um dos maiores custos e preços para o metro quadrado da construção civil (Em 2015, ocupou a 39ª posição na listagem dos metros quadrados mais caros do mundo. Fonte: EUA lideram ranking das ruas com o metro quadrado mais caro do mundo, http://gq.globo.com/Prazeres/Poder/noticia/2015/11/eua-lidera-o-ranking-das-ruas-com-o-metro-quadrado-mais-caro-do-mundo.html, acessado em 28/03/2016) por causa da baixa produtividade da mão de obra e dos recursos utilizados.

Os números gritam algumas revelações. A primeira é que o aumento do preço de venda do metro quadrado da construção civil ocorrido nos últimos anos, não gerou aumento da produtividade. Ou seja, os que acreditam que podem aumentar a produtividade pela majoração do numerador da equação estão equivocados. A segunda revelação é que a redução do denominador através de baixos salários e benefícios para a mão de obra também não é capaz de aumentar a produtividade. Os números do Brasil da construção deixam bem claro que as propostas para flexibilização das leis e benefícios trabalhistas não são condição necessária e suficiente para aumentar a produtividade. É preciso ir além das atuais propostas para tirar o país da recessão.
Tenho certeza que o primo de Porto Alegre vai estrilar, mas já está na hora de ir direto ao ponto. É de fundamental importância qualificar os serviços de Tecnologia de Informações e Comunicações (TIC). Uma grande parte da evolução tecnológica da construção civil entre 2000 e 2013 está relacionada com TIC. Não podemos fazer mais do mesmo e afirmar que a produtividade da mão de obra da construção civil não avançou por causa apenas da qualificação dos trabalhadores. Uma grande parte desta estagnação é consequência direta das falhas dos sistemas de TIC e da baixa qualidade dos serviços do Service Desk.

No dia 30 de julho 2015, eu estava no Shopping Frei Caneca na cidade de São Paulo. Ao resolver tomar um café as 10 horas na loja Starbucks eu descobri que a mesma estava com o seu sistema TIC inoperante e as vendas estavam interrompidas porque não existia uma previsão para o seu retorno. Como não foi a primeira vez que presenciei tal situação eu resolvi pesquisar o impacto das indisponibilidades de TIC na produtividade brasileira.

Eu selecionei os seguintes artigos para exemplificar os problemas: “Brasileiras perdem US$ 18 milhões com indisponibilidade de aplicações”, http://computerworld.com.br/brasileiras-perdem-us-18-milhoes-com-indisponibilidade-de-aplicacoes, “Site e caixas eletrônicos do Itaú ficam fora do ar após queda de sistema”, http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/08/1666808-site-e-caixas-eletronicos-do-itau-ficam-fora-do-ar-apos-queda-de-sistema.shtml?mobile, “Black Friday 2014 frustra quem esperava evolução do e-commerce brasileiro”, http://idgnow.com.br/blog/circuito/2014/11/29/black-friday-2014-frustra-quem-esperava-evolucao-do-e-commerce-brasileiro/, “Caixa diz que sistema voltou ao normal e vai abrir 1 hora antes nesta sexta”, http://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2014/11/06/caixa-abre-uma-hora-mais-cedo-nesta-sexta-por-causa-de-falha-no-sistema.htm, acessados em 28/03/2016). Todos os casos mostram que as falhas de TIC reduziram a produtividade dos trabalhadores. Não são casos de falta de qualificação da mão de obra do negócio.

O caso da loja Starbucks do Shopping Frei Caneca em 30 de julho 2015 revelou também como as práticas empresariais adotadas no Brasil estão reduzindo a nossa produtividade. O Brasil não tem a exclusividade de falhas nos sistemas de TIC que impedem a abertura do caixa de uma loja. Isto também acontece nos Estados Unidos. No entanto, a cultura empresarial norte americana é bem diferente da brasileira. No nosso caso, a indisponibilidade fez com que os funcionários avisassem os clientes que a loja estava fechada. Nos Estados Unidos, a atitude é bem diferente. Mesmo com o sistema inoperante a loja é aberta e os clientes são atendidos. Isto ocorre basicamente por três motivos.

O primeiro é que se o cliente não for atendido ele vai acabar indo para uma outra loja (no meu caso eu escolhi a Kopenhagen) e existe o risco do cliente gostar dos produtos e serviços recebidos e deixar de ser seu consumidor. O segundo motivo é que ao processar manualmente todos os atendimentos, a loja é capaz de quantificar exatamente quanto ela perde por causa de uma falha de um sistema de TIC. Fica claro para os gestores qual a relação entre o custo e benefício para investimentos em segurança de TIC. O terceiro motivo é que não existe nada mais frustrante na cultura americana do que ir ao trabalho e ficar sem fazer nada por causa de um computador. Ao escolher pela operação normal. os trabalhadores não ficam ociosos e sem motivação. É frustrante estar no trabalho e simplesmente não poder fazer nada por causa de uma falha de um equipamento.

No Brasil, a escolha pelo fechamento da loja não é capaz de motivar os funcionários para serem proativos (justificar para o patrão que devem trabalhar mesmo sem condições de cobrar os clientes) porque eles não têm perspectiva de longo prazo na empresa. Se o cliente mudar para a Kopenhagen, isto não é um problema, porque quando o Starbucks começar a sofrer com a falta de clientes eles estarão trabalhando em uma outra empresa. Ou em outras palavras, a política empresarial brasileira desfavorece o crescimento da produtividade.


É bastante claro que é possível evoluir muito em termos de ganhos de produtividade sem a realização de reformas estruturais na economia (elas são contestadas por muitos trabalhadores). Existem soluções mais simples e óbvias que podem ser realizadas. Basta olhar para os países mais avançados e copiar. No caso das falhas de suporte dos sistemas de TIC, existe um enorme espaço que as empresas de tecnologia podem ocupar. No entanto, elas precisam olhar com mais atenção a questão da qualificação e acabar com o preconceito contra o cabelo branco.

quinta-feira, 3 de março de 2016

WhatsApp o retorno

Muitos estão comparando o imbróglio jurídico da Apple contra o FBI com o caso do Facebook com a justiça brasileira. Infelizmente está faltando informação e conhecimento nos comentários e análises.  O caso da apple contra o FBI nos Estados Unidos é análogo ao FBI pedir ou exigir que um fabricante de cofres viole a segurança do seu produto com base na argumentação que dentro do cofre existem documentos que vão incriminar os terroristas presos. Estamos claramente falando de uma questão comercial onde o fabricante pode perder bilhões de dólares por desrespeitar os direitos de todos os seus clientes. Com tantos crimes passando de uma forma ou outra pelo sistema financeiro seria razoável ver o FBI solicitando acesso aos computadores e cofres dos bancos. Eu nunca vi até hoje este nível de disputa contra a privacidade entre o FBI e bancos. Parece que está no mínimo faltando coerência histórica de atuação.

O caso da prisão do vice-presidente do Facebook por não colaborar com a justiça brasileira na quebra do sigilo do usuário do WhatsApp é mais um caso de falta de capacitação do que de coerência histórica. Em primeiro lugar a justiça brasileira foi incapaz de estabelecer um acordo de colaboração com as redes sociais que estão instaladas fisicamente nos Estados Unidos e cumprem a legislação americana (O acesso a uma rede social fora do Brasil deve ser entendido como viagem ao país que abriga os servidores). Este acordo deveria ter sido estabelecido em 2012. Estamos em 2016 e nada foi feito. Eu tenho total certeza que as redes sociais americanas têm total interesse na eliminação dos casos de crimes. Elas fariam de bom grado acordos de cooperação.

No entanto, tem pouco sentido pedir publicamente a colaboração do WhatsApp em um processo que corre em segredo de justiça. Está mais do que na hora da justiça ser mais coerente e colaborativa com as redes sociais. As informações solicitadas como o IMEI e sistema operacional são afirmadas como inexistentes pelo Facebook. A justiça brasileira precisa falar de onde ela arrumou a informação que o WhatsApp guarda o IMEI e sistema operacional dos equipamentos dos seus usuários. É preciso acabar com este tipo de conflito.

Alguns juristas afirmam com base no Marco civil de Internet (MCI) brasileiro que os registros solicitados pela justiça nacional devem ser armazenados pelo provedor. Qualquer profissional de tecnologia qualificado vai facilmente mostrar que a guarda do IMEI ou sistema operacional do equipamento não consta nas obrigações definidas no MCI. Além do problema da definição do que deve ser armazenado pelos provedores, existe a questão da geografia jurídica. Os servidores do WhatsApp estão localizados nos ESTADOS UNIDOS e atendem aos requisitos de privacidade da lei americana. Isto significa que existe um claro conflito legal que já deveria ter sido resolvido pela justiça brasileira.

Seria interessante esclarecer porque a justiça brasileira não solicita estas informações para as operadoras nacionais de telecomunicações. Elas são obrigadas a cumprir as determinações do MCI. Com base nos registros dos provedores é possível identificar a localização geográfica do autor das mensagens e fazer uma ação de busca e apreensão dos equipamentos e aí ter acesso integral as mensagens. O que realmente está faltando não é colaboração do WhatsApp.

A pergunta que não quer calar é o que vai acontecer com os presidentes da Microsoft, Alphabet, Apple do brasil se os equipamentos apreendidos estiverem criptografados com senhas? Eles vão ser presos porque não destruíram a confiança que os seus clientes depositaram neles? A justiça brasileira vai continuar a colocar na cadeia trabalhadores honestos e deixar nas ruas os bandidos? Até quando o Brasil vai ignorar que o mundo mudou e que é preciso contratar engenheiros qualificados para fazer parte do sistema judiciário? Para finalizar é sem sombra de dúvida brilhante a estratégia de criar um conflito pelo bloqueio do WhatsApp e esperar a colaboração deles. Os gênios da justiça nacional precisam urgentemente de um chapéu pensador.